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ANATOMIA DO POEMA – UMA ANTOLOGIA

08/02/2022

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Leia a seguir uma seleção de poemas e alguns relatos elaborados durante a oficina ‘Anatomia do Poema’, conduzida por Yasmin Nigri, em novembro passado na Escrevedeira online. As aulas incentivaram os participantes a escrever e/ou reescrever seus textos, a partir de elementos poéticos apresentados e discutidos nos encontros, compondo pouco a pouco a forma final de cada poema.

 

E a boa notícia é que a oficina com Yasmin tem mais uma edição agora em fevereiro, começando no próximo sábado, dia 12.

Veja mais informações aqui.

 

 

INEXATO 

 

Tudo ali, mas não vejo. 

Só estocando com primor 

se defaz do bloco a resistência. 

 

Tudo ali, mas não ouço. 

Só sentindo o frio na orelha 

se escuta da pedra a sílaba. 

 

Tudo ali, mas não declamo. 

Só devassando um pétreo orgão 

se oferece da caixa a festa. 

 

Ah, se eu esquecesse xis e ípsilon… 

 

 

* um relato sobre o processo individual 

 

No começo, sinto-me fora de sintonia; só nado de braçada em ambientes repletos de números, cálculos e problemas binários (respondidos com sim ou não). Meio sem jeito, guardo pra mim as dúvidas e os comentários; os termos soam estranhos, falta-me desenvoltura. Quando parto para as tentativas de escrita, é difícil começar, avalio que sou incompente. Mas toco levemente em uma área de conforto, certas dores aliviam, aparece alguma criatividade desconfiada. Vem-me o estigma da falta de produtividade, tenho que ser sempre produtivo, a mente é um senhorio terrível. Ao longo das reuniões da oficina, misturam-se momentos de insight com temor de estar totalmente desconectado. No último dia, a leitura pública da minha “produção” tranquiliza, pois trazem mais auto-conhecimento. A audácia de sair do seu mundo por alguns momentos sempre se paga.

 

Tiago Massoni

 

 

[sem título]

 

suspiro

não servido aos convidados

diriam estava muito áspero

 

tradutor

cuja bússola

aponta outro norte

 

sínteses de símbolos

abruptamente

interrompidos

 

 

* um relato sobre o processo individual  

 

Os encontros foram muito interessantes para que eu pudesse refletir sobre o modo de fazer poesia. Mais do que o suporte, mais do que a seleção das palavras, há procedimento. Fugir da lógica sintática da língua e das ligações semânticas já dadas é muito difícil, e eu acredito que agora estou mais ferramentada, por assim dizer, para prestar atenção nessa questão. Talvez, em vez de entender a lógica do poema, é entender como ele causa estranhamento, funda as suas próprias lógicas de seleção e encaixamento das palavras. Eu achei bem legal o exercício de concentrar o poema nas imagens, recusando os artigos e quaisquer outras coisas mais funcionais da língua (quando possível), e focando mesmo nas palavras que tem mais densidade. Muito legal, tomara que tenha uma segunda edição!

 

Camila Franquini

 

 

 

[sem título]

 

Viver o silêncio 

encontrar o vigor: 

intrincada linguagem brutos vínculos. 

 

Retorcer os ferros estruturais 

casas de compor descobrimento 

 

em tramas, ondas 

multifacetadas em materiais e imateriais 

desígnios do amanhecer. 

 

Fortaleza em território descoberto. 

Porque ela agora. 

 

Rita Zerbinato

 

 

OFICINA DE POESIA

 

Acho graça da palavra metalinguagem.

Será que sonhei com David Foster Wallace

troçando dos formalistas russos?

Porque o sério pode ser risonho, acredite.

Mas os juízes não pensam assim, não.

 

Escrever é um troço

todo louco de ver.

A gente vai criando

uma meta

fora da vida

que se chama poesia,

esta coisa perigosíssima. 

Malu Alves 

CORPO POEMA 

 

Arrasta fronteiras 

tecido, cheiro, letra 

voz que perfura lua 

fantasma do sol 

em campo de arroz 

 

un perro andaluz 

acompanha sua sombra 

lápis e papel nas mãos 

som do mundo caindo 

pés clandestinos 

tirando sapatos 

 

para correr no lago 

onde Bashô ouviu plop plop 

sapo no som das águas 

ondas em papel de arroz 

corpo poema tecido contrátil. 

 

Alexandre Farias

 

ODE AO MOMENTO 

 

ah se a gente pudesse 

engarrafar os momentos 

seria sopa, bolo, 

vinho, barro, 

vidro e ouro

a gente ia 

olhar o firmamento 

e perguntar

 

Elza Beckman 

 

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